Saturday, April 03, 2010

Um Sonho Possível


Não nascemos com destinos pré determinados. Outro dia assisti Zuenir Ventura falando sobre a violência no Rio. Contou como desistiu da idéia comunista de que o homem é produto de seu meio ao recontar em livro (Cidade Partida) as histórias de dois garotos sobreviventes da chacina de Vigário Geral que conheceu na favela. Um saiu dali, estudou, virou sociólogo e vive nos Estados Unidos. O outro virou traficante e foi morto num tiroteio.
Há lugares e circunstâncias que parecem empurrar pessoas para um caminho de perdição.
Algumas pessoas que procuram esse caminho voluntariamente, algumas vezes por pura estupidez.
Outras, que nasceram e viveram ali pensam que talvez este seja o único caminho.
Já outras, às vezes com imenso esforço, percebem que há outros caminhoas a seguir, e agarram qualquer oportunidade que lhes passe pela frente para sair dali.
Um Sonho Possível é a história de como Michael Oher, um garoto negro, gordo, sem família e saído do pior gueto de Memphis conseguiu estudar e se tornar uma estrela do futebol americano com a ajuda de uma família rica, branca e republicana, da qual acabou fazendo parte. Sandra Bullock mereceu o Oscar com todas as honras pelo papel que tem no filme da mãe adotiva de Oher.
Um crítico babaca da Folha de S. Paulo escreveu que o filme era "paternalista" e que a personagem vivida por Sandra Bullock é daquelas que fazem caridade mais pelo prazer de mostrar aos outros que está fazendo caridade do que pelo ato em si.
Talvez o crítico tenha pensado que a verdadeira Leigh Anne Tuohy fez o que fez porque sabia que algum dia sua história iria parar em Hollywood.
Não, no Brasil não existe filme em que o pobre possa escolher seu destino. Escrevi isso quando assisti Em Busca da Felicidade (Pursuit of Happinness) com Will Smith. Como a culpa de todos os males que te afligem é sempre do "sistema", sua salvação está sempre em rebelar-se contra o sistema, é o que se chama aqui de conscientização. Tem que virar líder sindical, traficante, herói-bandido, o que quer que seja, menos alguém que tomou as rédeas da própria vida, ainda mais com a ajuda de uma branca da elite.
Que alguém como Leigh Anne responda à sua formação cristã como o filme mostra, também é inconcebível para a crítica brasileira. Uma branca rica só pode fazer caridade se for por vaidade, é óbvio.
Mas não é tão óbvio assim para mim. É como disse David Bentley Hart em Atheist Delusion, mesmo os piores de nós criados à sombra da cristandade somos incapazes de olhar com indiferença o sofrimento alheio sem ferir a nossa própria consciência.
É disso que o filme fala, e é esse sentimento que ele traz nas pessoas que o assistem.
Há milhares de pessoas no Brasil que fogem diariamente do destino que lhes foi jogado nas costas. Esses sonhos podem ser sempre mais possíveis quando não são olhados com indiferença.

3 comments:

alessandra said...

Concordo Fernando!
E gostaria de deixar registrado que as pessoas são boas ou más por escolha própria, tá aí uma coisa que agente pode fazer, independentemente do sistema, da mãe, da favela, da escola, da cor e da classe social.
No mais o que que tem vc querer ser reconhecido pelas boas coisas que faz, merecidamente??? Ruim e errado é ser reconhecido pelas coisas ruins que fizer, aí sim, está errado.

Mas te garanto que faço boas coisas sem querer reconhecimento, mas quando o tenho fico mais motivada, feliz e cheia de certezas, e isso é muito bom!

Zé Costa said...

Pôr a culpa no sistema,Fernando, é típico dos medíocres.

Veja o meu caso: família muito pobre, mas muito pobre, estudei, me dediquei e se não avancei na carreira acadêmica foi mais por desinteresse do que por barreiras sociais ou intelectuais. Podia choramingar e dizer que a necessidade do meu sustento e de minha família me atrapalharam, mas não! Não avancei porque não quis.

Um abraço

Bípede Falante said...

Não vi ainda o filme. Agora, tenho uma boa razão para ver. Gostei muito da sua opinião. Dá uma seriedade ao filme que eu não tinha certeza de que havia. Bacana!