Ainda me lembro quando a Princesa Diana morreu. Era madrugada, pelo menos para mim, que tinha virado a noite em uma festa e estava com uma ressaca do capeta. Um colega de república veio me chacoalhar na penumbra da noite, mais animado pela possibilidade de me acordar do que pelo furo jornalístico. “Acorda que a princesa Diana morreu!! Acorda aí!”. Se bem me recordo eu o mandei enfiar a princesa lá, where the sun never shines... Eu nunca fui mesmo muito preocupado com os destinos de Lady Di ou da Casa de Windsor. Já bastou toda a comoção na época da sua morte, e agora 10 anos depois voltam todas as imagens e histórias, inclusive as cabeludas teorias da conspiração que rondam a morte da princesa.
Madre Teresa de Calcutá morreu exatamente na mesma semana que Diana, mas obviamente ninguém dá o menor ibope para a velhinha, que não tinha nenhum apelo fashion cuidando de seus leprosos.
Diana tinha sim compaixão pelos oprimidos. Como qualquer pessoa decente tem. Em seu recém lançado livro sobre a princesa, a jornalista e editora Tina Brown conta que uma criança angolana ferida por minas chegou a acreditar que Diana fosse um anjo ali ao pé da sua cama. Mas Tina Brown conta também que Diana, que dizia ela mesma ser uma loura burra, podia ser cruelmente manipulativa, fria com amigos e calorosa com desconhecidos, e era uma adúltera compulsiva. A liar and a saint.
O fato é que Diana transformou realeza em celebridade, algo que seus dois filhos estão continuando a fazer com a série de cretinices que performam em público devidamente documentadas.
Este confronto entre o mundo criado pela princesa e pela mídia que ela sabia usar como bem queria, e a realeza à moda antiga encarnada pela rainha é mostrado com perfeição no filme The Queen, com Helen Mirren. No filme, um recém empossado Tony Blair tenta fazer a mediação entre a família real e o povo indignado pela morte da princesa e pela frieza dos Windsor. A certa altura do filme, a Rainha Elizabeth anda pela sua propriedade em Balmoral, onde a família está desde a morte de Diana. Ela enxerga um majestoso cervo, senhor das highlands onde vive e de certa maneira identifica-se com ele. Estes são os dias onde milhares de pessoas deixam flores nas portas do Palácio, rezam e cantam pelas ruas santificando a princesa morta. Dias depois o cervo é morto por caçadores da fazenda vizinha. Ela vê a carcaça do bicho dependurada e percebe que seu conceito de monarquia também morreu ali. Ela tem que se curvar à vontade do povo, retornar a Londres e por as bandeiras de Buckingham a meio mastro em homenagem à Diana.
Elizabeth II provavelmente se recuperou. E recuperou também a confiança de seu povo. William Underhill escreve em sua crônica na Newsweek que o povo britânico não estava de luto por uma pessoa que eles conheciam de verdade, e sim a personagem de uma novela que eles acompanhavam na mídia todos os dias. E bastou um toque das relações públicas dos Windsor para que o público se voltasse a seu favor. Underhill diz que ao que parece, o povo gosta de ver como chefe de estado alguém que está acima de modismos, seja em costura ou seja em política. Se a mídia prefere glamour, a posteridade requer responsabilidade.
Madre Teresa de Calcutá morreu exatamente na mesma semana que Diana, mas obviamente ninguém dá o menor ibope para a velhinha, que não tinha nenhum apelo fashion cuidando de seus leprosos.
Diana tinha sim compaixão pelos oprimidos. Como qualquer pessoa decente tem. Em seu recém lançado livro sobre a princesa, a jornalista e editora Tina Brown conta que uma criança angolana ferida por minas chegou a acreditar que Diana fosse um anjo ali ao pé da sua cama. Mas Tina Brown conta também que Diana, que dizia ela mesma ser uma loura burra, podia ser cruelmente manipulativa, fria com amigos e calorosa com desconhecidos, e era uma adúltera compulsiva. A liar and a saint.
O fato é que Diana transformou realeza em celebridade, algo que seus dois filhos estão continuando a fazer com a série de cretinices que performam em público devidamente documentadas.
Este confronto entre o mundo criado pela princesa e pela mídia que ela sabia usar como bem queria, e a realeza à moda antiga encarnada pela rainha é mostrado com perfeição no filme The Queen, com Helen Mirren. No filme, um recém empossado Tony Blair tenta fazer a mediação entre a família real e o povo indignado pela morte da princesa e pela frieza dos Windsor. A certa altura do filme, a Rainha Elizabeth anda pela sua propriedade em Balmoral, onde a família está desde a morte de Diana. Ela enxerga um majestoso cervo, senhor das highlands onde vive e de certa maneira identifica-se com ele. Estes são os dias onde milhares de pessoas deixam flores nas portas do Palácio, rezam e cantam pelas ruas santificando a princesa morta. Dias depois o cervo é morto por caçadores da fazenda vizinha. Ela vê a carcaça do bicho dependurada e percebe que seu conceito de monarquia também morreu ali. Ela tem que se curvar à vontade do povo, retornar a Londres e por as bandeiras de Buckingham a meio mastro em homenagem à Diana.
Elizabeth II provavelmente se recuperou. E recuperou também a confiança de seu povo. William Underhill escreve em sua crônica na Newsweek que o povo britânico não estava de luto por uma pessoa que eles conheciam de verdade, e sim a personagem de uma novela que eles acompanhavam na mídia todos os dias. E bastou um toque das relações públicas dos Windsor para que o público se voltasse a seu favor. Underhill diz que ao que parece, o povo gosta de ver como chefe de estado alguém que está acima de modismos, seja em costura ou seja em política. Se a mídia prefere glamour, a posteridade requer responsabilidade.
4 comments:
Olá Fernando,
Como sempre, mais um ótimo texto seu. E que, além de tudo, me fez rir um bocado com "enfiar a princesa where the sun never shines"!
Aqui na França também está essa babação de ovo para a Diana. Mas é assim mesmo, a morte midiatizada tem poder santificador.
Vi uma peça excelente aqui, adaptada a partir do texto "The naked truth", de David Lodge. A reflexão final da montagem, focada no episódio Diana, era justamente sobre a imposição de uma verdade construída por uma mídia deslumbrada, e que se sobrepõe a tudo e a todos.
Abraço e, mais uma vez, parabéns pelo blog.
Vou ver o filme só por causa do teu texto.
Meu novo chefe, um inglês da alta, conheceu Diana. Ele a odeia. Disse que ela era insuportável e que por muitas vezes, quando estava no mesmo grupo que ela, a própria ligava para os jornalistas para dizer que ia para tal lugar e que sairia a determinada hora.
Ele disse que ela era arrogante, antipática, com um caráter péssimo e que sente pena das pessoas que acreditam que ela era um anjo por causa daquele sorrisinho. Ele diz que só quem conheceu a princesa na intimidade é que entende a ignorância das pessoas que acreditam que ela tinha um coração de ouro.
Segiundo ele, todas as visitas que ela fazia eram devidamente estudadas para dar ibope e nada tinham a ver com o valor pela causa. Seu objetivo sempre foi superar a imagem da rainha. Parabéns, de alguma forma e pelo menos em algumas ocasiões, ela conseguiu.
Paula
Supongo que siempre ocurre lo mismo, lo de Diana y Teresa de calcuta, que tú comentas...
Aquí, en España, la semana pasada murió un futbolista, Antonio Puerta, la sociedad se conmovia, el futbol se hermanaba,los medios de comunicación halagando la sensibilidad y el buen hacer nacional....y yo sólo me preguntaba qué había sido de Francisco Umbral, fallecido un día antes que el joven futbolista.
Pero a muy pocos nos importó que una de las grandes firmas de la literatura española nos haya abandonado para siempre.
En fin, será que las injusticias permanecen, aún con la muerte.
Saludos
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