Tuesday, October 28, 2008

O futuro da alimentação em Paris


Um Salão de Alimentação é mais ou menos como um Salão do Automóvel, ou uma Fashion Week. Você vai lá vender seu peixe, olha o que os outros estão fazendo, vê as tendências do mercado, pensa no futuro.
Alimento hoje não é mais algo que você come desfrutando seu sabor e partilhando uma mesa. O mercado hoje pede muito mais do que isso. A comida de hoje:
- Tem que ser prática e fácil de preparar. Na Holanda por exemplo, o tempo médio de preparo de uma refeição é de 15 minutos. O microondas impera na cozinha moderna. Há legumes cortados em sacos plásticos prontos para serem cozidos a vapor no forninho, há até hamburguers e bifes grelhados prontos para serem esquentados no microondas. Vi um outro salgadinho de carne que pode ser preparado na torradeira de pão.
- Tem que ser saudável, o que não quer dizer exatamente saudável, quer dizer que é light ou diet, ou tem fibras, ou antioxidantes, ou omega 3 ou qualquer outra coisa que diga ao consumidor que ele vai viver mais se comer aquilo.
- Tem que ser nutritivo (embora você ignore na maioria das vezes o que há ali dentro). Por exemplo, um lançamento premiado por inovação no Salão foi a Coca-Cola Light com vitaminas... Não sei o porque do prêmio de inovação, o Brasil já produzia Groselha vitaminada Milani quando, como diz uma amiga, minha vó andava de skate. Precisamos de melhores marketeiros.
- Tem que ter um certo apelo exótico, lembrar receitas de países distantes, ou usar ingredientes misteriosos vindos da Indonésia ou das montanhas do Nepal. Como se a comida fosse uma agência de viagens gustativa e todo dia você viajasse um pouco à hora do almoço.
- Tem que ser politicamente correta, como esse chocolate onde a cada barra que você come uma árvore é plantada no mundo. Acredite se quiser. Orgânicos também estão em alta.
- Tem que ter uma embalagem bonita. Não interessa muito o que está dentro, a embalagem resolve metade dos seus problemas. Às vezes a embalagem é o que há de mais natural ali. E melhor ainda se ela ajudar você a comer de pé, andando, dirigindo, ou em frente ao computador. Sinal dos tempos.
E last but not least, uma exposição dentro do Salão mostrava um novo segmento do mercado, incipiente porém promissor. A comida cosmética. Ou os cosméticos de comida. Algo que só a França poderia associar.
Comida cosmética é aquela que promete intensificar sua beleza quando consumida. Como uma bebida à base de colágeno, que supostamente melhora sua pele. Ou um suco de aloe vera, para bem, não sei para quê. Por outro lado, há cosméticos que usam alimentos para venderem-se, como um esmalte de unhas a base de mel, sabonetes de frutas, patchs para a pele de pepino, sombra para os olhos de chocolate, creme de lábios de maçã. E há os que brincam com a percepção do consumidor, como a caixa de chocolate que parece estojo de maquiagem, ou um shampoo que vem em caxinha tetra pak como se fosse suco. Há também molhos de salada em sprays de espuma de barba. Às vezes é preciso olhar bem para saber se aquele sabonete é de comer ou não. Mantenha longe do alcance de crianças.
O que eu acho sinceramente de tudo isso? Fico feliz que tenhamos tantas oportunidades de escolha assim. Principalmente quando vejo fotos de supermercados em antigos países comunistas. Mas gostaria de saber que estou comprando o que quero porque eu quero, e não porque os drs. Strangeloves da indústria acham que eu preciso. O mesmo raciocínio vale para moda ou para carros.

No caso da comida, sou e sempre serei um slow-food man, daqueles que acha que comida boa é aquela que leva no mínimo um dia inteiro para ser preparada, de preferência no fogão de lenha.
Eu me lembro de uma tira de jornal de Calvin & Hobbes, onde o Calvin chega correndo para a mãe e diz: “Mãe, mãe, acabei de ver na tv a propaganda de um monte de produtos que eu não sabia que existiam mas que eu preciso desesperadamente!!”
O marketing de alimentos, e aliás o marketing em geral, se transformou na ciência de criar necessidades que você até então não sabia que tinha.
Já há até uma nova profissão na praça por conta disso, o food-designer. É aquele cara que cria um nugget que vai deixar seu filho obeso e diabético, mas como ele tem a forma do Mickey e vem numa caixinha colorida você compra porque o petiz vai ficar feliz e finalmente comer alguma coisa. Bons tempos em que as mães sentavam ao seu lado de sua cria com a cinta na mão caso ela não terminasse de engolir aquela couve cozida.
Vi Jamie Oliver na tv em uma escola do sul da Itália, perguntando aos bambini o nome de cada legume que ele mostrava. Foi emocionante ver a criançada berrando zucchini, melanzana, broccoli... Jamie repetiu a experiência em uma escola inglesa, e foi um fracasso. Os moleques criados à base de batata frita e hambúrguer não sabiam distinguir um pé de alface de uma berinjela.
Uma das promessas da modernidade é supostamente teríamos mais tempo livre para nós. Seria a slow-food dos meus ancestrais napolitanos assim tão incompatível com a modernidade?
Taí uma pergunta que eu gostaria de ver respondida em futuros salões de alimentação.
Mesmo porque, há outro problema muitíssimo mais grave decorrente das modernas tendências da alimentação. Cada vez menos neste planeta moderno, famílias partilham refeições à mesa. Nada de bom pode sair daí.

3 comments:

bete p.silva said...

Nada de bom pode sair daí,concordo.

Mas cinta na mão Luciano, que cruel...

Cê ainda não tem filhos né? então tá...

A gente se fala...:):):)

Anonymous said...

quem é Luciano???

Anonymous said...

Fernando,

Coca-Cola light vitaminada deve ter gosto de purgante!!! Eca! Morro de medo da minha velha e boa Coca-Cola não ser fabricada mais... Tenho pavor disso! Sou viciada! Mas eu posso, não bebo, não fumo, moro na fazenda e sou magra.

E Fernando meu querido, sem querer fazer inveja... Aqui em casa só se come comida feita no fogão à lenha, carne fresca de boi, frango caipira e cordeiro sempre tenho à mão, suco, só natural, de cajú,limão acerola com carambola, maracujá e graviola. Nos finais de semana tomamos muita Coca-Cola e água de coco, já te contei que aqui em casa temos 1200 pés de Côco? Temos uma horta enorme, um pomar enorme e muito produtivo, enfim, o Jamie Oliver, que adoro, iria adorar minha casa.
Em tempo, suco de Aloe Vera (babosa) é muito bom e é até gostoso se vc misturar com capim cidreira e limão, dizem que até faz cabelo nascer em quem está carequinha.
Mais uma, minha entiada que morou alguns anos de sua infância comigo aqui na fazenda, só sabia comer nuguets, arroz e batata frita, também tomava um copo de leite forçado todos os dias, com a ajuda infalível da cinta da mãe dela em cima da mesa. Como sou pacifista e não era mãe dela, e portanto, ficava impedida de usar a "cinta" ( não tenho nada contra quem usa, só não consigo usar)inventei uma nova técnica: - descobri que ela adorava banana frita com açúcar e canela, daí deixava um pratão da deliciosa receita ao lado dela e dizia que assim que comesse o prato de arroz, feijão, carne, quiabo, couve e saladas ela poderia desfrutar da banana. E Sabe que deu certo!!! Um dia ela até comeu jiló com tomate verde e beringela! Incrível né?

Se vc e a Jú vierem aqui em casa eu prometo fazer muita comida gostosa no fogão à lenha para vcs!!!

Abraço