Tuesday, July 21, 2009

Angeli in Cielo


Em nossa incessante luta para produzir um herdeiro, tarefa que revelou-se mais difícil do que prediziam os manuais, apelamos à diversas simpatias caseiras, ao chá milagroso dos índios da Amazônia, ao Kama Sutra indiano, à novena de N.S. do Perpétuo Socorro, ao Frei Galvão, à Santa Sara, aos Espíritos do Além, tudo isso sem resultados (ainda conhecidos). Há algum conselho mais inútil do que: “desencana que vem” a dar a uma engravidanda?
Nossa última esperança viria das luzes da Ciência, e dos modernos avanços da medicina reprodutiva. Fazem tanta coisa hoje em dia, não deveria ser assim tão complicado encomendar um baby, como se fosse um kit de montar da Revell.
E de repente lá estava eu no banheirinho da clínica de fertilidade, potinho numa mão e a Playboy da Fran na outra, me preparando para realizar a minha reduzida parte do processo. Eu já passara por inúmeros outros exames e testes igualmente constrangedores, mas nada comparado às injeções diárias de hormônio na barriga da Juliana e aos exames de filme de alienígena pelos quais ela passou.
No fim produzimos dois embriões perfeitos que por algum motivo se recusaram a grudar na parede do útero. Deu chabu. Faiou. O sonho virou um mar de lágrimas.
Biologicamente, uma criatura que é incapaz de se reproduzir não existe. Ninguém jamais saberá que um determinado cão, macaco ou camelo existiu a não ser pela sua descendência.
À parte a decepção de talvez não vir a saber que cara teriam meus filhos, a vantagem de ser humano é que felizmente nosso legado nesse mundo não se resume aos genes que deixamos por aqui. Nem eu tenho a pretensão de que a humanidade evoluiria à base dos meus pobres genes carregados de problemas cardiovasculares.
O legado humano é infinitamente maior do que possa estar escrito em um DNA, está registrado em palavras, atos e valores que transmitimos não só aos filhos mas a todos, família, amigos, colegas, leitores, conhecidos e anônimos que um dia cruzaram nosso caminho, e esse legado pretendemos deixar em bom estado.
Entretanto ainda há fé de que tudo venha a acontecer naturalmente, o que está longe de ser impossível. O fato aparentemente cruel ou arbitrário é na verdade uma lição de humildade renovada. A gente quer ter voz ativa e no nosso destino mandar, mas há coisas que não dependem da nossa vontade e cuja compreensão está além da nossa vã filosofia e limitada ciência.
Há tanta gente com cruzes infinitamente mais pesadas e dolorosas a carregar, que em vez de maldizer os céus pelo que não temos devemos voltar a agradecer pelo que temos.
Pois se há coisa mais triste do que pais sem filhos são os inúmeros filhos sem pais, ou os ignorados, maltratados e vendidos pelos mesmos.
Meu irmão pensou um dia se trocaria seus filhos por toda a fortuna do homem mais rico do mundo. Viu que a resposta era negativa e concluiu então que o homem mais rico do mundo era ele. Pena que há quem não perceba o mesmo.

5 comments:

Sandra Leite said...

uma vontade de dizer tanta coisa que só cabe num abraço.

Alice said...

E um beijo duplo.

Lelec said...

Oi Fernando,

Seu post me deixou sem palavras. Depois, vou tentar lhe escrever algo mais consistente, mas nem sei se vou conseguir...

Sinto muito mesmo. Você e a Juliana têm todo meu afeto.

Seja como for, eu (e acho que todos seus leitores) sou grato por ser seu herdeiro em um monte de boas idéias e de valores que você nos lega neste blog.

Grande abraço e força sempre.

Lelec

Alessandra said...

Só hj pude ler...
Vcé muito lindo.
Me emociona sempre.
Um beijo especial na Jú, por favor.

clabrazil said...

Estão cogitando adoção? Tenho uma grande inclinação para ela. Por isso me interesso.

E sua fé religiosa, ajuda? Sua inteligência mostra sinais de conforto quando leio textos assim. Ela te perpetuará também.

Beijos na Juliana.
Clarisse