Tuesday, May 01, 2007

Indigènes


Este filme do argelino Rachid Bouchared foi assistido em première por Jacques Chirac e suas esposa Bernardette Chirac no ano passado. Quando terminou a sessão, ouviram a primeira-dama sussurrar no ouvido do marido que ela não sabia que tinha sido assim.
Na verdade pouca gente sabe que mais da metade do exército de 550 mil homens comandado pelo General de Gaulle na reconquista da França na Segunda Guerra Mundial era formado por soldados das colônias francesas na África, árabes, berberes e negros.
O filme conta a história de quatro argelinos engajados no exército francês desde o desembarque na Itália até a retomada da Alsácia. Lutando por uma pátria que eles nunca tinham visto antes, os “bougnoules”ou indigènes lutam não só contra os nazistas mas sobretudo pelo reconhecimento dos franceses que nunca veio.
De Gaulle sonhava com uma Union Française, onde as colônias seriam elevadas ao mesmo status social que a Metrópole (Ainda hoje a Guiana é administrada como se fosse um département français, e os índios aprendem na escola sobre nossos ancestrais os gauleses...). Visto o tratamento que recebiam dos franceses, o império colonial acabou desmoronando e a Argélia se desligou da França da forma mais dolorosa, em uma horrível guerra cujas cicatrizes ainda estão vivas nas memórias coletivas dos dois lados do Mediterrâneo.
É impossível não lembrar do Soldado Ryan no final de Indigènes, quando um dos veteranos visita os túmulos dos companheiros de armas em um cemitério na Alsácia. À diferença do americano que volta para casa com a família, o cabo Abdelkader volta para seu apartamento solitário em uma imunda cité da periferia, onde os franceses acabaram por confinar seus ex-colonos.
As pensões militares dos africanos que lutaram pela França na segunda guerra foram cortadas depois da indepêndencia de seus países. Somente em 2002, quando a maioria dos veteranos estava morta ou idosa demais, a Corte Suprema decidiu pelo pagamento de todas as pensões atrasadas, pagamento este nunca executado até a aparição deste filme. Os quatro protagonistas dividiram o prêmio de melhor ator no Festival de Cannes do ano passado, mas esta foi a verdadeira vitória do filme de Bouchareb. Revisitar o passado é a única saída dos franceses para enfrentar a ferida do racismo colonial que nunca sarou.

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