Saturday, January 19, 2008

Tribos


No primeiro dia do ano, uma turba armada de porretes e facões cercou uma pequena igreja de madeira e lata na vila de Kimbaa, no Quênia. Lá dentro escondiam-se cerca de 200 pessoas, homens, mulheres e crianças. Depois de assaltarem os homens e estuprarem as mulheres, a igreja foi incendiada. Alguns sobreviventes reconheceram os atacantes como amigos, conhecidos e vizinhos. O problema é que eram de outra tribo. O Quênia, antes reconhecido como um dos países mais promissores e pacíficos da África está revivendo os horrores já vistos em vários outros países africanos como o Rwanda, Uganda, Zimbábwe e tantos outros. É impossível entender o que se passa no Quênia sem compreender o processo histórico descrito brilhantemente por Martin Meredith em The State of Africa. A partilha da África pelos colonialistas transformou 30 mil unidades políticas do continente em cerca de 40 países. Nos movimentos pela independência, lutas tribais e partidos políticos se confundiram numa salada de sangrenta. O padrão de comportamento do presidente recém eleito Mwai Kibaki é o mesmo de todos os outros facínoras do continente: ganhar uma eleição a qualquer custo, se possível roubando. Uma vez no poder, tentar fazer de tudo para manter-se aí, inclusive atiçando as diferenças étnicas no país. Beneficiar os membros da própria tribo com todas as vantagens que o poder oferece, perseguir ou ignorar as outras tribos. Acusar a oposição por todos os males do país. Recusar qualquer intervenção de fora. Encher o bolso enquanto dá tempo. Diferenças étnicas e culturais levam séculos de evolução para desaparecerem. Mesmo na Europa, essas diferenças ressurgem na vida política atual, vide a Bélgica ou a Escócia, ou de forma violenta como aconteceu na Yugoslávia. Na África, ainda vai demorar muito para isso mudar. O Brasil nesse aspecto é privilegiado. Gilberto Freyre mostrou como a miscigenação foi fundamental na formação da identidade do povo brasileiro. De fato, é inimaginável para um brasileiro pensar que amanhã ele poderá fatiar o vizinho a golpes de machete por ele ser paraense, fã do Wando ou torcedor do Guarani (já que não temos tribos é preciso achar motivo).
Essa mistura é a melhor característica do povo brasileiro, e é exatamente o que o politicamente correto imbecil de hoje quer negar com suas cotas e com a neo-discriminação racial.

2 comments:

deboraHLee said...

É, Fernando, mas aqui ainda são queimados mendigos, índios, travestis. Nordestinos são agredidos... Estudantes africanos foram queimados na UNB...

Claro que não dá para comparar, mas acreditar que somos um país, onde a cordialidade reina nas relações entre as pessoas, no meu ponto de vista, é romantizar a realidade.

Vá em Belém e veja o preconceito enorme que existe com os descendentes mais diretos dos índios, maioria da população. As pessoas são chamadas de 'piolhentas' para baixo. Vai lá no Sul, onde cresci e veja como são tratados os 'polacos'. Sorry, não consigo enxergar esta suposta 'paz étnica-social' aqui,não!

beijo.

Alma said...

Déborah,
Não conheço nenhum país que seja essa mistura de raças que é o Brasil. É o único país onde já vi uma libanesa casada com um judeu por exemplo. Eu sou ums mistura de portugues, espanhol, italiano, alemão e sabe-se lá o que mais. Meu irmão casou com uma nissei.
Quantos morenos você vê na rua namorando loiras e vice versa?
No Brasil todo loiro é alemão, todo moreno é negão e todo asiático vira japa, mas isso não significa discriminação. Transformar isso em discriminação é a armadilha dos politicamente corretos que querem criar um racismo que é inconcebível na nossa realidade. Quase ninguém no Brasil tem 100% de certeza sobre suas origens étnicas.
Para mim, queimar mendigo ou travesti é delinquência pura e simples, não é limpeza étnica.
Eu ainda prefiro acreditar que a miscigenação é o maior triunfo do Brasil.