Thursday, April 16, 2009

Maldita Guerra


Francisco Doratioto pesquisou durante 15 anos arquivos e bibliotecas no Brasil, na Europa e no Prata para escrever esta Nova História da Guerra do Paraguai. Além disso viveu por três anos no próprio Paraguai visitando locais e recolhendo o que resta da memória viva do que os paraguaios chamam de a Grande Guerra.
Seu trabalho é essencial para reconstruir este capítulo trágico na história do continente e quebrar alguns mitos ainda existentes sobre a guerra.
Existiu um certo revisionismo histórico sobre a guerra e a figura de Solano Lopez tanto no Paraguai como no Brasil.
No Paraguai esse revisionismo foi patrocinado principalmente pela ditadura de Stroessner, para levantar a autoestima e o nacionalismo de um povo carente de heróis.
No Brasil, a esquerda anti-ditadura criou a figura de Solano Lopez como um libertador, oprimido pelo Império brasileiro e criou a idéia de que o Paraguai era uma sociedade muito mais justa do que as outras nações sul-americanas e que sua indústria incipiente representava uma ameaça aos interesses imperialistas dos britânicos, que teriam forçado o Brasil a entrar na guerra.
Doratioto destrói os mitos com documentos e fatos. Quando a guerra começou o Brasil tinha rompido relações diplomáticas com a Inglaterra que na verdade tentou evitar o conflito. O Paraguai era um país miserável, e a maior parte de suas terras era vista por Solano Lopez como sua propriedade particular.
Lopez centralizava todo o poder econômico do país e a nascente indústria paraguaia tinha por objetivo único aumentar seu poderio militar.
Sua ambição e vaidade eram tamanhas que eliminou toda a elite de oficiais e políticos paraguaios que pudessem desafiá-lo, inclusive seus irmãos e cunhados.
Seus filhos foram nomeados oficiais do exército ainda crianças.
Suas decisões militares eram estúpidas e causaram a morte de milhares de seus soldados.
Em suas batalhas finais enviava crianças ao front, com barbas postiças para que parecessem adultos.
Quando foi finalmente capturado e morto pelos brasileiros em Cerro Corá, diz-se que era fácil identificá-lo. Era o único homem gordo em meio a um exército de famélicos.
Um dos mais importantes intelectuais paraguaios contemporâneos, Guido Rodriguez Alcalá não hesita em compará-lo a Hitler pela mobilização para a guerra total a que ambos levaram seus respectivos países.
Doratioto analisa ainda as causas da guerra e a difícil situação dos aliados no campo de batalha de um país desconhecido, com campos alagados e doenças epidêmicas, com um clima que ia do calor escaldante ao frio gelado do sul, do qual não existiam mapas e com um inimigo que preferia morrer a render-se. Além disso começava essa nova guerra de posições e trincheiras, que havia surgido na Guerra Civil americana e que teria seu auge na Grande Guerra européia no século seguinte. O então Marquês de Caxias chegou a importar balões dos EUA para estudar as posições paraguaias.
Caxias e Osório são consagrados como os grandes homens das forças aliadas, enquanto o Almirante Tamandaré, comandante (e hoje patrono) da Marinha é descrito como incompetente.
Outro mito é o da chacina promovida no Paraguai pelas tropas aliadas. Durante o revisionismo chegou-se a citar como 1 milhão o número de paraguaios mortos, o que é impossível visto que a população do país não passava dos 450 mil habitantes na época. Hoje as estimativas variam de 28 a 278 mil os paraguaios mortos. Uma pequena parte no campo de batalha. A grande maioria de doenças e de fome nas retiradas forçadas por Solano López.
Morreram cerca de 50 mil brasileiros. A grande parte também de doenças.
O livro, Guerra Maldita, da Companhia das Letras traz ainda uma bela coleção de fotos, ilustrações e recortes de jornais da época além de reproduções dos quadros de Candido Lopez, pintor argentino que acompanhou as tropas.

1 comment:

Prof. Zé Paulo said...

Excelente resumo Fernando. Essa obra é do ínício da década de 80 e ainda hoje ou obrigado, em sala de aula, a desconstruir o esquerdismo bocó na explicação desse conflito.

É por essas e outras que sou tachado de neoliberal. Se a verdade contradiz a esquerda, pior para a verdade, não é?

Um abraço.