Wednesday, March 25, 2009

E o Papa tinha razão


Durante sua recente visita à África, um repórter francês pediu ao Papa Bento XVI que defendesse a posição da Igreja na luta contra a Aids (que o francês caracterizou como "frequentemente considerada irrealista e ineficaz") Esta foi a resposta do Papa:

"Eu diria que este problema da Aids não pode ser superado com slogans de propaganda. Se não se cuida da alma, se os africanos não se ajudam uns aos outros, o flagelo não pode ser resolvido com a distribuição de preservativos, é o contrário, arriscamos agravar o problema. A solução só pode vir através de um duplo compromisso: em primeiro lugar, a humanização da sexualidade, em outras palavras, uma renovação espiritual e humana trazendo uma nova maneira de agir de um para outro. Em segundo lugar, a verdadeira amizade, acima de tudo com aqueles que estão a sofrer. Uma prontidão - mesmo através do sacrifício pessoal - para estar presente para com aqueles que sofrem. E esses são os fatores que ajudam a trazer progressos visíveis."

O Papa queria passar uma mensagem de amor, respeito e compaixão. Obviamente foi tratado como uma besta quadrada e obscurantista pela imprensa liberal que se concentrou só na parte da resposta que lhes interessava: distribuir camisinhas pode agravar o problema da Aids.
Você, companheiro liberal, que também acha que o Papa é uma besta, e que se levantou rapidinho da cadeira com o dedo em riste fazendo eco à manada, é sempre bom conferir suas certezas antes de acusar a ignorância alheia.
Edward C. Green, diretor do AIDS Prevention Research Project no Harvard Center for Population and Development Studies confirma na National Review: O Papa estava certo.
Pois é. Em estudos de população (não em indivíduos), a distribuição de preservativos é agravante. Segundo Green: "há uma associação consistente mostrada por nossos melhores estudos entre uma maior disponibilidade de preservativos e níveis maiores (não menores) de infecção por HIV. Isso se deve em parte devido a um fenômeno conhecido como compensação de risco, significando que quando uma pessoa usa uma ‘tecnologia’ de redução de risco, como os preservativos, ela frequentemente perde o benefício (redução de risco) ‘compensando’ ou se arriscando mais do que uma outra pessoa normalmente se arriscaria sem a tecnologia de redução de risco”.
Ou seja, se não se cuida da alma...
E cuidar da alma não é exatamente o que fazem as campanhas brasileiras contra a Aids, que sempre mostram que se tá de camisinha é só cair na farra...

Em tempo, uma seqüência dialética irrefutável montada por Olavo de Carvalho que comenta em artigo os recentes casos de estupros infantis e o aborto em Olinda:
Tese: a pretexto de proteger mulheres e crianças, procede-se à demolição da autoridade paterna, bem como dos princípios morais que a sustentam;
Antítese: nas famílias desfeitas – surpresa! –, proliferam os estupros e a gravidez infantil;
Síntese: o aborto é elevado à categoria de obrigação moral, e em seu nome o Estado condena a religião como imoral e desumana e se autoconstitui em guia espiritual da sociedade.

16 comments:

Lelec said...

Olá Fernando,

Obrigado por me sinalizar seu texto. É muita cortesia de sua parte, como sempre.

Se o Papa tivesse dito que a camisinha sozinha não resolve o problema da AIDS, e que o melhor é conjugar o preservativo a uma prática sexual consciente e responsável, eu estaria de inteiro acordo com ele. Mas não foi isso o que ele disse. Ele falou que a camisinha AGRAVA o problema da AIDS.

Quanto ao artigo que você citou, não se trata de um artigo científico, não foi submetido à avaliação "peer-review" antes de ser publicado. Não há dados, não há referências. Por isso, há que se lê-lo com ainda mais cuidado.

A hipótese levantada pelo autor não é comprovada pela prática, já que nenhum país do mundo conseguiu reduzir os índices de AIDS sem incluir a distribuição de camisinha nas campanhas. O autor não explica isso no texto dele. E também não explica porquê as campanhas que não incluíram a camisinha resultaram em maiores índices de DST, AIDS e gravidez indesejada.

Mas eu fui mais longe. Pesquisei na base PubMed quais artigos científicos escreveu o autor por você citado. Ele co-assina artigos em revistas importantes, como "Lancet" e "AIDS Behavior". Em todos os artigos, ele cita que o uso do preservativo foi parte fundamental da redução dos índices de AIDS em países africanos, particularmente em Uganda. Em nenhum dos artigos a hipótese que ele evoca no artigo para a imprensa leiga é corroborada. Em nenhum artigo ele sustenta que o preservativo "agrava o problema da AIDS".


Quanto ao texto do Olavo, ele está longe de ser irrefutável. Olavo sofisma: ele parte de premissas falsas.

No caso da menina pernambucana, eu apóio a realização do aborto. Por uma questão médica. Diga-me, por favor, já que o Olavo não vai me responder: em que meu apoio nesse caso pretende minar a "autoridade paterna"?

E outra questão: se estupros e gravidez precoce só acontecem em famílias nas quais a autoridade paterna foi destruída, por que vemos tantos casos de gravidez em adolescentes de famílias estruturadas, de pais presentes?

Outro ponto: então o apoio ao direito ao aborto significa entronizar o Estado como guia espiritual da sociedade? Não me parece ser essa a posição de muitos que defendem o direito ao aborto, como Mainardi, Janer Cristaldo, Hélio Schawartsmann, Rodrigo Constantino e milhões de cidadãos de países liberais (no sentido político e econômico), como a Holanda. Olavo sustenta essa idéia para associar o direito ao aborto com a pauta de comunistas e esquerdistas stalinistas. Não é sempre assim. Você morou na Holanda. Os holandeses que defendem o aborto são comunistas? Querem o Estado como guia espiritual?

Olavo produz sofismas como eu bebo água.

Se ele é filósofo, eu sou astrofísico nuclear.

Abraço,

Lelec

flávia said...

A Igreja Católica retrógrada, nem mesmo aceita o uso da camisinha em plena epidemia de uma doença sexualmente transmissível como a Aids. Isso é pensamento religioso medieval,chega até a comprometer o futuro do planeta.Affe!

Lelec said...

Oi Fernando,

Parece que o Vaticano mudou de idéia e agora diz que a camisinha ajuda no combate à AIDS. Em suma, parece que o Vaticano diz que si, o Papa errou...

Veja aqui:

http://www.lefigaro.fr/actualite-france/2009/03/25/01016-20090325ARTFIG00032-sida-l-eglise-ne-proscrit-pas-le-preservatif-.php

Abraço,

Lelec

Alma said...

Lelec,
O homi da Harvard falou: "há uma associação consistente mostrada por nossos melhores estudos entre uma maior disponibilidade de preservativos e níveis maiores (não menores) de infecção por HIV."
Acho que ele não ia mentir na National Review né? Liga lá e pede os estudos para ele.
Quanto ao Olavo eu sei que você não gosta dele, mas o que ele falou está certo. Principalmente a esquerda adora atacar valores que acham "conservadores", como a família. E os casos de abuso estatisticamente são muito maiores em famílias desestruturadas, você sabe disso. A Igreja aponta o erro e os liberais reagem desclassificando a Igreja como retrógrada e impondo ao Estado seus novos valores pela gritaria. Foi exatamente isso que aconteceu na Holanda, e que acontece em todo lugar onde o liberalismo quer se impor.
Depois que Ligar pro Mr. Green liga pro Olavo também. E manda um abraço.

Alma said...

Não, o Papa tá certo:

"Sa conclusion ne met donc pas en cause le préservatif, en tant que tel, mais les campagnes le proposant comme seul moyen sûr. «L'expérience de terrain démontre que dans les pays où l'on a tout misé sur le tout préservatif, il n'y a pas eu - dans la population générale - des résultats satisfaisants comme ceux obtenus en Ouganda"

Lelec said...

Olá Fernando,

Vou começar de trás pra frente: o documento do Vaticano diz que os resultados em Uganda não colocam em discussão a eficiência do preservativo como parte importante das campanhas contra a AIDS. Não defendo (e nenhum especialista do assunto defende) que a camisinha SOZINHA resolva o problema da AIDS. Na reportagem do Figaro diz inclusive que a Igreja admite que o "ABC" funciona, mesmo não sendo essa a diretriz da Igreja para seus fiéis. Isso não lhe parece diferente de dizer que a camisinha AGRAVA o problema da AIDS?

Se eu for conversar com o Olavo como converso com você, corro o risco de ouvir um monte de palavrões. Melhor ficar por aqui mesmo. Você é educado.

Não é questão de gostar ou não do Olavo. É apenas constatar que ele sofisma.

Concordo que a maioria dos casos de estupro, pedofilia e etc acontece em famílias desajustadas. Isso é fato. Mas o argumento do Olavo diz que os que defendem o direito ao aborto o fazem para destruir a família. Volto a perguntar: quem defende o aborto da menina pernambucana só quer mesmo destruir a família? O Olavo inverte os fatores: o aborto deixa de ser ACEITÁVEL na gravidez precoce em uma família desajustada, passando a ser o meio que as esquerdas usam para desajustar as famílias. O aborto é mesmo causa de desajuste familiar? Não será o contrário: o aborto acontece porque há desajuste familiar? Não faz sentido a colocação do Olavo.

Quanto ao "homi" da Harvard, não preciso escrever para ele, porque o artigo que você citou NÃO foi escrito por ele. Foi escrito por Kathryn Jean Lopez, que menciona algumas idéias do pesquisador. Não sei se as idéias dele foram tiradas fora do contexto. Na dúvida, conferi o que ELE MESMO escreveu, em artigos científicos. E lá não há nada que seja diferente do que os especialistas do mundo todo dizem: que camisinha e mudanças comportamentais são efetivas no combate à AIDS.

É isso.

Abraço,

Lelec

Alma said...

O problema está na distorção do que o Papa disse. Leia a resposta dele com cuidado. Ele não fala que camisinha agrava o problema, ele fala que as campanhas que focam só na distribuição de camisinha (como as do Brasil) ARRISCAM-SE a agravar o problema.
No que Harvard concorda.

O Olavo é um amor de pessoa, liga lá pra ele.

Lelec said...

Oi Fernando,

Onde foi que o Papa diz que "arriscam-se a agravar o problema"?

Me dê a referência, por favor. Em todos os lugares que vi, o Papa diz "AGRAVA o problema". São coisas muito diferentes.

Não estou distorcendo o que o Papa diise. Atenho-me às suas palavras. Primeiro, ele fala que a distribuição de preservativos que AGRAVA o problema. Agora, o Vaticano diz que os preservativos são eficazes no combate à AIDS.

Cadê a distorção?

Não conheço as campanhas brasileiras. Se elas dizem que usando a camisinha pode-se transar à vontade que não se pega AIDS, elas estão mentindo e isso é errado.

Abraço,

Lelec

PS: Aqui no Figaro a frase do Papa, como ele falou:

http://www.lefigaro.fr/international/2009/03/18/01003-20090318ARTFIG00554-sida-les-propos-du-pape-creent-l-indignation-en-france-.php


PS2: Dê uma passeada no blog "De Paris", do Antônio Ribeiro, da Veja. Ele aborda isso tudo que estamos discutindo.

Alma said...

Companheiro, você não dá o braço a torcer não é? O pessoal aí do hospital sabe que você está coçando na internet em vez de atender seus doidos? hehehe...

A frase do Papa, exatamente como ele disse está em itálico no meu post. E está aqui também:

http://www.catholicnewsagency.com/new.php?n=15403

A imprensa, inclusive o Figaro é que pôs do jeito que lhes interessava pra fazer barulho.
Essa imagem do post é de uma campanha brasileira, olha aí um exemplo. O pintinho tá todo feliz indo pra farra só porque tá de camisinha...

Lelec said...

Rapaz, eu sou duro na queda mesmo... Aida vou perder o emprego por causa dessas polêmicas.

Aqui a citação em inglês.

"If the soul is lacking, if Africans do not help one another, the scourge cannot be resolved by distributing condoms; quite the contrary, we risk worsening the problem."

Mas o Papa falou em francês (ele respondeu a uma pergunta de um jornalista francês):

Segundo o Figaro:

"Il a ainsi estimé que l'on ne pouvait «pas régler le problème du sida», pandémie aux effets dévastateurs en Afrique, «avec la distribution de préservatifs». «Au contraire (leur) utilisation aggrave le problème», a-t-il ajouté."

Nas duas o Papa fala que distribuir camisinhas agrava (ou "pode agravar", dependendo da tradução que se faz da tradução em inglês do que o Papa falou em francês... Ufa!).

Por que o Vaticano divulga hoje um documento dizendo claramente que a camisinha é sim, efetiva e ajuda no combate à epidemia de AIDS? Se a posição anterior fosse 100% correta, não sujeita a contestação, não precisaria dar esclarecimento algum, concorda? Para quê voltar ao assunto? Mas eles resolveram esclarecer. Deve ser porque sabem que o que o Papa disse não era exato.

Agora me diz uma coisa: se tudo não passa de uma distorção do que o Papa falou, se tudo é complô da imprensa internacional, haja capacidade de organização, hein? Todos os jornais de tudo quanto é lugar divulgando de uma tacada o que o Papa falou... Quem está por trás dessa conspiração deve mesmo ser poderoso para conseguir mobilizar todo o mundo ao mesmo tempo. Que "meda".

A imagem do bilau serelepando na folia dá mesmo a entender que com camisinha se fica 100% protegido. Concordo que seria melhor uma outra abordagem, a que apela a um sexo consciente e com responsabilidade.

Abraço,

Lelec

bete p.silva said...

Não importa nessa questão se a igreja é retrógrada ou não é retrograda, mesmo pessoas erradas falam coisas certas. Mesmo sem as considerações de Green eu já achava o texto certo.

Ficar distribuindo camisinhas me soa meio romano, os caras comiam, comiam, e enfiavam o dedo na boca pra vomitar. Tudo é farra, tudo é festa?

Fernando, se eu ainda fosse da liderança da igreja metodista, eu mandava uma passagem de avião pra você vir até aqui palestrar aos jovens.

Lelec said...

Oi Fernando,

Para esclarecer um ponto: o Papa não disse "podem agravar o problema", ele disse "aumentam" o problema. A fonte?

O site do Vaticano:

http://www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/speeches/2009/march/documents/hf_ben-xvi_spe_20090317_africa-interview_po.html

Abraço,

Lelec

Alma said...

Pode ser, mas agrava mesmo, e não sou eu que confirmo, é Harvard...

E eu estou contente porque dei a notícia antes do Reinaldo Azevedo...Hahah

Alma said...

Pode ser, mas agrava mesmo, e não sou eu que confirmo, é Harvard...

E eu estou contente porque dei a notícia antes do Reinaldo Azevedo...Hahah

Lelec said...

Eu de novo...

Não é bem isso o que Green fala nos artigos científicos que ele mesmo escreveu.

Falo sobre isso aqui:

http://aterceiramargemdosena.blogspot.com/2009/03/reinaldo-azevedo-malabarista.html

Abraço,

Lelec

PS: Amanhã respondo ao seu email.

Neilza Barreto said...

Uau! Quanta coisa, hein...

Olha, em primeiro lugar, "AMEI" esta postagem. Amei grande e com direto a aspas!

Algumas questões importantes:

1.Acredito que vivemos numa grande crise afetiva. Sim, vivemos!Num mundo que cada vez mais vive bem com a lógica do efêmero e da descartabilidade acho que o tema da AIDS deve ir mais longe que o uso do prservativo. Ainda que acredite que o uso do prservativo é um elemento importante na diminuição da AIDS. Precisamos de mais ALTERIDADE, ou seja, preciso do outro para me reconhecer como sujeito. Dito de outra meneira, preciso amar. Coisinha brega para os supostos eruditos...Mas eu que colho, cotidianamente, as lágrimas alheias em meu consultório, sei que precisamos amar sim!Eu poderia usar um bocado de nomes acadêmicos para algo tão simple: amar!

2.Vivemos numa outra crise, crise do discurso de autoridade. è nesta que se funda o discurso da paternidade, ou como diria Lacan "O Nome do PAI". Este é bem complexo e não diz respeito somente a uma figura de homem na família. Trata-se da construção de uma moldura social. Ou seja de um espaço onde existam "limites"."Não" isso não pode! È fundamental estabelecermos nãos! Pois só nesta lógica do "não" construímos o respeito ao próximo e, sobretudo o respeito a gente mesmo!Sabemos conviver com o "sim" qdo conhecemos o "não"!
O "não" é função paterna, podendo ser exercida por homens ou mulheres. Por isso, Lelec que não dá para falar de família estruturada do lado de fora! Muitas vezes há um homem na família mas este não exerce função nenhuma(papo quente para outra ocasião!).

3. Concordo (e muito!) com Fernando, pois alguns temas são ridicularizados ou "retorcidos" para caírem na lógica consumista do "desuso". Acho que a grande questão da AIDS é uma reforma na forma de viver e estar no mundo( é claro, usando tb prservativo!)

4. Mas não só a questão da AIDS está inserida numa reforma na maneira de estar no mundo, mas a questão da solidão tb! Solidão esta que produz tanta coisa, dentre elas uma maneira indistriminada de banalização do afeto e das relações amorosas. Banalização esta que deixa homens e mulheres cada dia mais vazios. Mas dirão vcs, o vazio é constituição básica do sujeito. Eu respondo: sim, mas precisamos da ilusão da completude!

Beijinho Fernando!