Saturday, February 23, 2008

Uma semana, filosofia do regresso


Em exatamente uma semana estarei a bordo do vôo KLM Amsterdam-Guarulhos, depois de 8 anos vivendo na Europa, 6 na Holanda.
Minha casa parece atingida por um tornado. Já não encontro meus livros, meus discos, meus filmes, tudo empacotado e embalado. Ando confuso e triste, e ao mesmo tempo ansioso. Nem durmo direito, com um sono agitado e cheio de sonhos estranhos.
Algumas pessoas me perguntam porque diabos eu vou voltar para o Brasil, aquela zona, aquela violência, corrupção, lamaceira, enquanto poderia viver o resto da vida tranquilamente em um dos países com os mais altos índices de desenvolvimento no mundo. Well, cada vez mais eu tenho vontade de dizer que não há nenhuma razão particular para deixar a Holanda, mas que quero buscar minha felicidade mesmo no Brasil.
O Brasil pode ser a jaca que for, mas o fato é que nos sentimos bem lá. Outro dia estava olhando uma mórbida estatística da OMS de suicídios por cada país, e desde já peço desculpa por levantar esses dados. No Brasil são 6.8 suicídios por 100.000 habitantes . Na Holanda são 12.7, na Austrália 17.1, na França 27.5, na Finlandia 31.1. Tudo bem o sujeito querer se matar porque nasceu no Kazaquistão (51.0) ou nos confins da Rússia (61.6). Mas na Austrália? Na Holanda? E no pobre Peru que a taxa de suicídios é de 1.1? Nas Filipinas de 2.5?
Camus disse que a única questão filosófica relevante é o suicídio.
Um cazaque pode se matar por não ter absolutamente nenhuma esperança a que se agarrar. Um finlandês se mata porque não vê mais sentido ou desafios naquele mundo perfeito e imutável que o cerca. Quando o sujeito tem muita coisa, fica deprimido até quando perde a chave do carro. Em me lembro de uma cena no primeiro filme Matrix, onde o agente Smith interroga Morpheus e diz que as máquinas tentaram fazer uma Matrix onde tudo fosse perfeito, mas que falhou miseravelmente por ser tão perfeita. Os humanos, segundo ele, necessitam caos.
Não acredito que eu precise de mais caos do que a minha sala está, mas acho que no Brasil, há tantas coisas pelas quais lutar (inclusive a própria pele em alguns casos), que acabamos dando mais valor à vida, e de certa forma somos mais felizes ou mais conformados por isso.

3 comments:

Leila Silva said...

Análise interessante...
wellcome home!

Lelec said...

Cher Fernando,

Não deve ser nada fácil mesmo... Tento imaginar seus sonhos esquisitos, a apreensão e as dúvidas que lhe perpassam... Tarefa difícil. Só sei que eu também passarei por experiência semelhante, no tempo apropriado.

Mas não deixe a tristeza lhe assaltar. A Holanda e a Europa estarão para sempre na sua memória. Lembre-se do que escreveu Saramago: "fisicamente, ocupamos um espaço, mas, sentimentalmente, ocupamos uma memória".

Sua memória, assim como a de sua esposa, estarão sempre cheias de tudo o que viveram aí. Ninguém vai lhes roubar isso, as lembranças estarão com vocês onde vocês estiverem.

E o Brasil é um país sofrido, mas maravilhoso, belo como nenhum outro. E, tenho certeza, você será muito feliz onde estiver.

Só não vale parar de escrever aqui!

Abração, mon ami!

Lelec

A Fresca said...

Fernando, sinceramente, se vc estiver bem espiritualmente, estará bem no inferno, ou seja, aqui, hahaha. As mudanças são boas, e necessárias, novos riscos, novos desafios.
Boa viagem pra vcs. Beijo.